quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Solução à greve passa por ampla reforma.

Especialistas avaliam que a motivação para as paralisações extrapola o período eleitoral e discutem as soluções

Patrícia Teixeira analisa que políticas favoráveis ao serviço público e alterações na legislação trabalhista são caminhos para evitar greves

Somente neste ano, a população cearense enfrentou dificuldades por conta da paralisação de diversas categorias de servidores públicos. Serviços básicos em educação, segurança e saúde, por exemplo, vem sendo interrompidos de forma mais frequente desde o ano passado, a níveis municipal, estadual e mesmo federal.
Especialistas cearenses avaliam que a motivação extrapola o momento eleitoral e apontam que as soluções passam por uma reforma ampla, envolvendo a legislação trabalhista e o modelo administrativo dos governos.
A cientista política Patrícia Teixeira, professora da Universidade de Fortaleza, afirma que tanto os governos quanto a sociedade são culpados pela grande incidência de greves ultimamente. Ela explica que os servidores públicos deveriam ter melhores salários e condições de trabalho e que é preciso encontrar meios de estimular um equilíbrio maior, com menos desigualdades entre servidores públicos e privados.
Pressão
Nesse sentido, ela acredita que as soluções devem passar por várias questões, como pressão maior aos governos para tomar medidas econômicas que favoreçam o funcionalismo público, além de alterações na legislação trabalhista e da intensificação de políticas com o objetivo de alcançar meios mais igualitários de trabalho.
No entanto, diz Patrícia Teixeira, um modelo de administração pública adequado para solucionar a questão das greves é algo muito abrangente e, embora vários estudiosos já tenham se debruçado sobre o tema, eles ainda não conseguiram definir um caminho ideal. “Acredito que é preciso uma reforma ampla. Agora a questão é: por onde se inicia essa reforma? A escassez nos recursos e no trabalho está ai, não consigo apontar ainda uma alternativa. Ainda não existe uma resposta, mas algumas sugestões”, afirma a professora.
Patrícia Teixeira afirma que os movimentos grevistas têm a sua importância, mas lembra que muitos integrantes se engajam com uma motivação mais política do que mesmo pela causa trabalhista. “E aí realmente quem sai como grande prejudicada é a sociedade”, admite.
Patrícia Teixeira salienta que as greves existem desde sempre e foram se convertendo em instrumentos de reivindicação política. Por outro lado, afirma, a eficácia dos movimentos depende da mobilização da sociedade.
“Os governos são responsáveis pelo problema, mas a sociedade também tem sua parcela de culpa por ser tão resignada. Não temos tanto a capacidade de reivindicar. Nos indignamos muito, mas não partimos para o confronto”, opina.
Insatisfação
Na avaliação da cientista política, os meios de comunicação tem favorecido bastante os movimentos grevistas, e a internet tem grande influencia nisso. “O fato de as pessoas terem mais acesso às notícias talvez seja um dos componentes dessa explosão. Mas também há insatisfação com a desigualdade nas condições de salário e de trabalho. Nas redes sociais, você vê o tempo todo a comparação entre salários de políticos e de servidores”.
Para Patrícia Teixeira, o fato de a sociedade estar mais conectada em rede tem contribuído, com o apoio em algumas das causas, para a incidência dos movimentos grevistas. “A gente sabe também que greves são ações coletivas e expressão do conflito e de lutas de classes na sociedade. Mas elas têm o fator político, foram mostradas nos jornais gravações de pessoas ligadas a partidos incitando a greve dando dicas de como categorias deveriam se mobilizar”, diz.
Razões
Já o professor de economia da Unifor e especialista em gestão pública, Mário Monteiro, acredita que as razões das greves que vem sendo deflagradas desde o ano passado são diferenciadas. “No caso da greve da policia, tem a PEC 300 que gerou uma expectativa sobre o piso salarial”, exemplifica o especialista.
De outro lado, afirma o professor, há um mercado de trabalho aquecido que gera a pressão por aumentos salariais para várias categorias. “Tem essa situação da economia, que traz uma percepção generalizada de que, no mercado de trabalho, é um momento favorável a ele (categoria)”, explica.
Expectativa
No âmbito federal, Mário Monteiro analisa que uma série de expectativas sobre a valorização dos trabalhadores públicos foi alimentada historicamente pelo partido que hoje está no governo. “Quando oposição, os atuais governantes inflaram a expectativa dos servidores públicos. Depois viram que tinha a responsabilidade fiscal. E aí essas expectativas, junto com mercado de trabalho aquecido, gera o momento adequado pra pressão e as greves”, avalia.
Questionado se falta um projeto administrativo dos governos que priorize mais os direitos da sociedade, maior prejudicada pela deflagração de greves, o professor Mário Monteiro diz que o que pode ser observado, do é que há um aparelhamento do executivo que leva à perda da racionalidade econômica.
Subordinado
“E aí deixa de ter um projeto. O setor público fica subordinado a agendas político-partidárias. Perde-se a consistência da gestão e da maquina pública. É óbvio que tem consequências nada favoráveis. Não podemos esquecer que o que esta acontecendo vem também da sociedade porque seus governantes foram eleitos por ela”, acrescenta.
Dessa forma, Monteiro diz que a sociedade não está sendo enganada. Por outro lado, para minimizar os prejuízos à população, ele defende que é preciso regulamentar o direito de greve do setor público. “Outro aspecto passa pela sociedade, que precisa ter maior consciência”, diz.
Do ponto de vista econômico, o professor Mário Monteiro afirma que há uma necessidade para melhorar o marco regulatório do setor público.
“E nisso entra o direito de greve, além de estabelecer uma política clara e definida de remuneração no setor público, eliminando ou pelo menos reduzindo determinadas condutas que causam perda de eficiência”, argumenta. Porém, ele acredita que essas são soluções pontuais e que cabe sempre à população cobrar ações dos políticos que elegem.
Neste ano, pelo menos 11 categorias de servidores públicos realizaram movimentos grevistas no Ceará. Delas, pelo menos cinco realizaram paralisações: Polícia Militar, Polícia Civil, Detran, AMC e agentes de saúde e endemias de Fortaleza. Outros intensificaram as manifestações e fizeram ameaças de greve, como servidores do Samu, da Guarda Municipal, do IJF, além de agentes penitenciários e de servidores do Judiciário e do Sistema de Verificação de Óbitos.


FONTE: http://policialbr.com/profiles/blogs/ce-solucao-a-greve-passa-por-ampla-reforma?xg_source=msg_mes_network#ixzz1nd5XE1nq
http://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/3.0/br/legalcode
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